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Deus, a melhor porção do cristão (1 de 2) Jonathan Edwads

Salmos 73. 25
“Quem mais tenho eu no céu? Não há outro em quem eu me compraza na terra.”

Neste salmo, o salmista Asafe relata a grande dificuldade que havia em sua própria mente, ao observar os ímpios. Ele diz, nos vv. 2 e 3: “Quanto a mim, porém, quase me resvalaram os pés; pouco faltou para que se desviassem os meus passos. Pois eu invejava os arrogantes, ao ver a prosperidade dos perversos.” No v. 4, nos informa o que, nos ímpios, era o motivo de sua tentação. Em primeiro lugar, observa que eram prósperos, e tudo lhes ia bem. Observa, também, o comportamento deles na prosperidade, e o uso que faziam dela; e que Deus, apesar dos abusos, aumentava-lhes a prosperidade. Então, nos mostra de que maneira foi auxiliado nesta dificuldade, isto é, indo ao santuário, (vv. 16, 17), e procede para nos informar quais foram as considerações que o auxiliaram lá:
· A consideração do fim miserável dos ímpios. Ainda que prosperem no presente, chegarão, contudo, a um lamentável fim (vv. 18-20).
· A consideração do fim bendito dos santos. Embora estes, enquanto vivem, possam ser afligidos, contudo terão um fim feliz, vv. 21-24.
· A consideração de que o piedoso possui uma porção muito superior a do ímpio, embora não possua outra porção, senão Deus, como mostra o texto e os versículos seguintes.
Ainda que os ímpios vivam na prosperidade, e não tenham problemas como os demais homens, contudo, os piedosos, mesmo afligidos, estão em estado infinitamente melhor, porque têm Deus por sua porção. Não precisam desejar nada mais pois, o que tem Deus, tem tudo. Assim o salmista professa o senso e apreensão que teve das coisas: “Quem mais tenho eu no céu? Não há outro em quem eu me compraza na terra.”
No versículo imediatamente anterior, o salmista observa como os santos são felizes em Deus, tanto quando estão neste mundo, como quando são levados ao outro. São benditos em Deus aqui, pois Ele os guia com os seus conselhos; e, quando os toma, ainda são felizes, pois Ele os recebe na glória. Provavelmente, isto o levou, no texto, a declarar que não desejava outra porção, quer neste mundo, quer no porvir, quer no céu, quer na terra.
Daí aprendemos que: É o espírito de um homem verdadeiramente piedoso preferir Deus antes de todas as coisas, quer no céu, quer na terra.
Um homem piedoso prefere Deus antes de todas as coisas no céu
1. Ele prefere Deus antes de qualquer coisa que haja¸de fato, no céu. Todo homem piedoso tem o céu no coração. Suas afeições estão depositadas no que deve haver lá. O céu é sua pátria e herança escolhidas. Ele o encara como um viajante, que, em uma terra distante, encara seu próprio país. O viajante pode contentar-se em estar em terra estranha por pouco tempo, mas sua própria terra nativa é preferida por ele acima de tudo (Hb 11. 13): “Todos estes morreram na fé, sem ter obtido as promessas; vendo-as, porém, de longe, e saudando-as, e confessando que eram estrangeiros e peregrinos sobre a terra. Porque os que falam desse modo manifestam estar procurando uma pátria.” O respeito que o piedoso tem pelo céu pode ser comparado ao que uma criança, que está no estrangeiro, tem pela casa de seu pai. Ela pode estar satisfeita, por pouco tempo; mas o lugar para onde deseja retornar, e onde quer morar, é sua própria casa. O céu é a morada do Pai dos verdadeiros santos. Jo 14. 2: “Na casa de meu Pai há muitas moradas.” Jo 20. 17: “Subo para meu Pai e vosso Pai.”
Agora, a razão pela qual os piedosos têm, dessa maneira, o coração no céu é porque Deus está lá; é o palácio do Altíssimo. É o lugar onde Deus está gloriosamente presente, onde seu amor é gloriosamente manifesto, onde o piedoso pode estar com Ele, vê-lo como Ele é, e amá-lo, servi-lo, louvá-lo e gozá-lo perfeitamente. Se Deus e Cristo não estivessem no céu, não seriam tão ávidos em buscá-lo, nem suportariam tantas dores em uma laboriosa jornada através deste deserto, nem a consideração de que irão ao céu após a morte serviria de conforto nos labores e aflições. Os mártires não suportariam sofrimentos cruéis de seus perseguidores, com uma alegre perspectiva de irem ao céu, se lá não esperassem estar com Cristo, e regozijar-se com Deus. Não iriam, alegremente, esquecer suas posses terrenas, e todos os amigos mundanos, como milhares deles fizeram, vagando na pobreza e na rejeição, sendo indigentes, afligidos, atormentados, trocando sua herança terrena por uma celestial, não fosse sua esperança de estar com seu glorioso Redentor e com o Pai celeste. O coração do crente está no céu, porque o seu tesouro está lá.
2. O homem piedoso prefere Deus antes de todas as coisas que poderiam existir no céu. Não apenas há coisa alguma, de fato, no céu, que rivalize na sua estima com Deus; mas nada há que possa conceber, nada que possivelmente esteja lá, que seja mais estimado ou desejado por ele do que Deus. Alguns supõem que há no céu delícias bem diferentes daquelas que as Escrituras nos ensinam. Os muçulmanos, por exemplo, supõem que no céu devem ser desfrutados todos os tipos de delícias e prazeres sensuais. Muitas coisas que Maomé inventou são das mais convenientes para as luxúrias e apetites carnais dos homens que se possa imaginar, e, com elas, lisonjeou seus seguidores. Mas os verdadeiros santos não conseguem imaginar algo mais adequado a suas inclinações e desejos do que o que está revelado na Palavra de Deus: um céu de gozo do Deus glorioso, e do Senhor Jesus Cristo. Lá, estarão livres de todos os seus pecados, e serão perfeitamente conformados a Deus, e passarão uma eternidade em exercícios exaltados de amor para Ele, e no usufruto do Seu amor. Se Deus não pudesse ser usufruído no céu, mas apenas vasta riqueza, imensos tesouros de prata e ouro, grande honra do tipo que os homens obtêm neste mundo, e uma plenitude dos maiores prazeres e delícias sensuais - nenhuma destas coisas suplantaria a necessidade por Deus e por Cristo, nem a fruição deles no céu. Se este estivesse vazio de Deus, seria, de fato, um lugar solitário e melancólico. O piedoso está sensível que todas as diversões humanas não podem satisfazer a alma; e, portanto, nada o contentará, senão Deus. Ofereça a ele o que for, se o privar de Deus, considerar-se-á miserável. Deus é o centro dos seus desejos, e, quando você afasta sua alma do seu centro, ela não terá descanso.
É o temperamento de um homem piedoso preferir Deus a todas as coisas sobre a terra.
1. O santo prefere esse gozo de Deus, pelo qual espera no porvir, a qualquer coisa neste mundo. Não olha tanto para as coisas que são visíveis e temporais, mas para as invisíveis e eternas (1 Co 4. 18). O santo não desfruta senão um pouco de Deus neste mundo; não tem senão pouca intimidade com Deus, e goza um pouco das manifestações de sua glória e amor divinos. Mas Deus prometeu lhe dar, no porvir, plena fruição. E estas promessas são mais preciosas para o santo que as mais preciosas joias terrenas. O evangelho contém maiores tesouros, em sua estima, que os cofres de príncipes ou as minas dos índios.
2. Os santos preferem o que pode ser obtido de Deus nesta vida a todas as coisas no mundo. Há grande diferença nas realizações espirituais presentes dos santos. Alguns atingem maior intimidade e comunhão com Deus e conformidade com Ele que outros. Mas, as maiores realizações são ínfimas em comparação às futuras. Os santos são capazes de progredir nas realizações espirituais, e sinceramente desejam estas realizações adicionais. Não contentes com os graus já alcançados, estão famintos e sedentos de justiça e, como crianças recém-nascidas, desejam o sincero leite da Palavra, para que, por ela, possam crescer. É seu desejo conhecer mais de Deus, ter mais de sua imagem, e serem capacitados ainda mais à imitação de Deus e de Cristo em sua caminhada e conversação. Sl 27.4: “Uma coisa peço ao SENHOR, e a buscarei: que eu possa morar na Casa do SENHOR todos os dias da minha vida, para contemplar a beleza do SENHOR e meditar no seu templo.” Sl 42. 1, 2: “Como suspira a corça pelas correntes das águas, assim, por ti, ó Deus, suspira a minha alma. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando irei e me verei perante a face de Deus?” Sl 63. 1, 2: “Ó Deus, tu és o meu Deus forte; eu te busco ansiosamente; a minha alma tem sede de ti; meu corpo te almeja, como terra árida, exausta, sem água. Assim, eu te contemplo no santuário, para ver a tua força e a tua glória.” Veja também o Sl 84. 1-3 e Sl 130.6: “A minha alma anseia pelo Senhor mais do que os guardas pelo romper da manhã. Mais do que os guardas pelo romper da manhã.”
Ainda que nem todo santo tenha este ávido desejo por Deus no mesmo grau que tinha o salmista, contudo são do mesmo espírito; desejam sinceramente ter mais de Sua presença em seus corações. Que este é o temperamento do piedoso em geral, e não apenas de alguns santos em particular, mostra-se em Is 26. 8, 9, onde se fala, não de algum santo em particular, mas da igreja em geral o seguinte: “Também através dos teus juízos, SENHOR, te esperamos; no teu nome e na tua memória está o desejo da nossa alma. Com minha alma suspiro de noite por ti e, com o meu espírito dentro de mim, eu te procuro diligentemente; porque, quando os teus juízos reinam na terra, os moradores do mundo aprendem justiça.” Veja também Ct 3. 1, 2. v. 6, 8.
Os santos nem sempre estão nestes vívidos exercícios da graça: mas possuem tal espírito, e têm o sensível exercício dele. Desejam Deus e as realizações divinas mais do que todas as coisas terrenas; e buscam ser ricos em graça, mais do que fazem para obter todas as riquezas. Desejam a honra que procede de Deus, mais do que a dos homens (Jo 5. 44) e comunhão com Ele mais do que qualquer prazer terreno. São do mesmo espírito que o apóstolo expressa em Fl 3. 8: “Sim, deveras considero tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; por amor do qual perdi todas as coisas e as considero como refugo, para ganhar a Cristo”.
3. O santo prefere o que já tem de Deus a qualquer coisa neste mundo. O que foi infundido no seu coração na conversão lhe é mais precioso que qualquer coisa que o mundo possa ofertar. As visões que, às vezes, lhe são concedidas da beleza e excelência de Deus, lhe são mais preciosas que todos os tesouros dos ímpios. Ele valoriza mais a relação de criança na qual está para com Deus, a união que há entre sua alma e Jesus Cristo, do que a maior dignidade terrena. Essa imagem de Deus que está estampada em sua alma, ele valoriza mais do que quaisquer ornamentos terrenos. Em sua estima, é melhor ser adornado com as graças do Espírito Santo de Deus do que brilhar em joias de ouro, e com as mais caras pérolas, ou ser admirado pela maior beleza exterior. Valoriza mais o manto da justiça de Cristo, que tem em sua própria alma, do que os mantos de príncipes. Prefere os prazeres e delícias espirituais que, às vezes, tem em Deus, muito mais que todos os prazeres do pecado. Sl 84. 10: “Pois um dia nos teus átrios vale mais que mil; prefiro estar à porta da casa do meu Deus, a permanecer nas tendas da perversidade.”
Desse modo, o santo prefere Deus a todas as coisas neste mundo, pois:
1. Prefere Deus a todas as coisas que possui no mundo. Prefere Deus a todos os gozos temporais. Sl 16. 5, 6: “O SENHOR é a porção da minha herança e o meu cálice; tu és o arrimo da minha sorte. Caem-me as divisas em lugares amenos, é mui linda a minha herança.” Se for rico, o seu coração está principalmente nas riquezas celestiais. Prefere Deus a todos os amigos terrenos, e o favor divino a qualquer respeito obtido de criaturas semelhantes. Embora, inadvertidamente, tenham lugar no seu coração, e lugar até demais; contudo reserva o trono para Deus. Lc 14. 26: “Se alguém vem a mim e não aborrece a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda a sua própria vida, não pode ser meu discípulo.”
2. Ele prefere Deus a qualquer prazer terreno do qual tenha perspectiva. Os filhos dos homens põem, comumente, sua confiança mais em alguma felicidade terrena que esperam, e pela qual buscam, do que naquilo que têm em posse no presente. Mas um homem piedoso prefere Deus a todas as coisas que espera neste mundo. Ele pode, com efeito, pela prevalência da corrupção, deixar-se, por um tempo, levar por algum divertimento; contudo, cairá novamente em si, não sendo este seu temperamento uma vez que é outro o seu espírito.
3. É o espírito de um homem piedoso preferir Deus a qualquer gozo terreno que possa conceber. Prefere-o não apenas a qualquer coisa que possui, mas nada vê em posse de outras pessoas, que seja tão estimável. Tivesse ele a maior prosperidade do mundo, ou pudesse satisfazer todos os seus desejos terrenos, ainda assim, valorizaria a porção que já tem em Deus, incomparavelmente mais. Ele prefere Cristo aos reinos terrenos.

[God the best portion of the Christian]
 
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